“Ou aprendemos a viver como irmãos, ou vamos morrer juntos como idiotas”(Martin Luther King).
A prática da alteridade conduz da diferença à soma nas relações interpessoais entre os seres humanos revestidos de cidadania. Pela relação alteritária é possível exercer a cidadania e estabelecer uma relação pacífica e construtiva com os diferentes, na medida em que se identifique, entenda e aprenda a aprender com o contrário.
“Olhe para os dedos de sua mão. Eles são diferentes. Ainda bem. Exatamente por serem diferentes eles são harmoniosos quando vistos em conjunto. Já imaginou se eles fossem todos iguais?
Certamente teríamos dificuldade de fazer o que fazemos de maneira tão natural. A humanidade, pode-se dizer, é semelhante a uma mão. Somos diferentes numa família. Somos diferentes numa região. Somos diferentes numa nação. A diferença é inerente, portanto, à natureza humana. Que bom que assim seja.”(Carlos Pereira).
Ao se deparar com o diverso devemos, inicialmente, retirar da mente os agentes psicológicos do preconceito e da preocupação, isto é, aqueles julgamentos pré-concebidos, que e entram em ação desnecessariamente antes do tempo e aqueles trazem uma ocupação negativa espaço mental antecipada, com perda de energia. Devemos acabar com todo tipo de pré-conceito colocar a mente em branco para receber o conteúdo do outro sem uma opinião previamente formada. Faz necessário estar em estado de alerta percepção para entender os motivos pelos quais o outro concebe as coisas do seu jeito, estabelecer uma relação empática com o interlocutor, para finalmente, construir o ensino-aprendizado na relação, ampliar a capacidade de correlação, de interdependência, de entendimento e convivência fraternal.
Não há princípios de alteridade naqueles que não aceitam a dissidência de antigos companheiro, que não aceitam a oposição deliberada, a opinião, o ponto de vista diferente e adota-se uma postura de discriminação, trata o diferente com a indiferença não adota a tolerância como princípio básico de mediação das relações interpessoais. Não é um cidadão alteritário quem não consegue amar a natureza, os seres vivos e aos outros, que repudia o seu irmão simplesmente por ele possuir uma visão diferente de enxergar o mundo, de ver a mesma realidade.
Na família, na escola e na sociedade devemos ensinar ao educando, através do exemplo, o principio da alteridade, como o vetor norteador das relações interpessoais, para que possa eliminar de sua psique os agregados psicológicos inumanos da xenofobia, da aversão a pessoas e coisas estrangeiras, do racismo, para evitar o ódio e as guerras étnicas, dos preconceitos de idades e de classes sociais, dos estigmas, da discriminação,etc. E para ensinar precisamos ser a alteridade em si, fazermos como fez o nosso mestre, que vivenciou a alteridade e nos ensinou assim: “Fazei aos outros aquilo que queiras os outros façam a ti”.
Se pautarmos em nossas vidas pelas relações de alteridade, jamais iremos fabricar armas, material bélico e tudo aquilo que ceifa a vida de qualquer coisa do cosmo, que holisticamente coexistem interdependentemente conosco. Pois na relação de alteridade sentimos como se fossemos o outro, sentimos bem com o bem estar do outro e sofremos com a angústia do outro. Devemos saber colocar no lugar do outro, em qualquer situação, para compreende-lo integralmente. Se possuirmos nenhuma sensibilidade pelo outro, pelas coisas da natureza, é porque não somos revestidos de alteridade, não sabemos conviver com a pluralidade.
Alteridade seria, portanto, a capacidade de conviver com o diferente, de se proporcionar um olhar interior a partir das diferenças. Significa que eu reconheço o outro em mim mesmo, também como sujeito aos mesmos direitos que eu, de iguais direitos para todos, o que também gera deveres e responsabilidades, ingredientes da cidadania plena. Esta constatação das diferenças é que gera a alteridade, alavanca da solidariedade, da responsabilidade, eixo da cidadania.
O estado de intolerância é apoiado na ignorância de anticidadãos que buscam os menores pretextos para justificação de seus atos de maldade. A simplicidade dos sábios, a sabedoria dos silenciosos, a tolerância dos pacificadores, a alteridade e a solidariedade dos cidadãos, etc., são reais valores da Cultura da Paz e Não-violência.
Alteridade é uma palavra que vem ganhando uso acentuado nos meios sociais do século XXI, entretanto a palavra em si não serve para nada, se não for acompanha da praticada em si mesma. De nada adianta falar em alteridade, se não tivermos em nosso interior o estado de alteridade.
Alteridade é uma palavra que designa em sua profundidade o holismo presente nas leis de convívio entre os seres humanos revestidos de cidadania e na relação destes com todos os seres da natureza. A pessoa alteritária é mais fraterna em todos os sentidos, deixa de criticar, julgar, agredir, infligir leis e normas e passa a ser responsável pelos deveres e obrigações. Quem é altério trilha o caminho da não-agressão, do não-julgamento, luta pela paz de seus semelhantes, por estar em paz consigo mesmo, com a humanidade, com a vida.
Ao desenvolvermos a alteridade, nasce o respeito pela maneira de ser dos outros, levando-se em conta que todos somos seres em diferentes, com graus de compreensão diferente.
Nas nossas sociedades contemporâneas, onde impera a inalteridade, a racionalidade, sob as formas de ciência e tecnologia, no paradigma antropocêntrico, passou a ser instrumento de violência estrutural, no modelo social hegemônico neoliberal, onde se expressa como meio mais eficiente de dominação social, de controle ideológico, de exploração, de exclusão das maiorias economicamente desfavorecidas.
O sistema antropocêntrico, por intermédio da violência estrutural, produz vítimas de modo massivo. As vítimas da racionalidade do sistema vão ficando num beco-sem-saída. O sofrimento das maiorias excluídas ecoa pelas ruas das favelas, dos vilarejos. Mas a alteridade faz-nos adotar a perspectiva do olhar das vítimas, para através da cidadania profunda engendrarmos ações que nos levam a lutar para mudanças neste estado de coisas.
Os mecanismos do sistema neocapitalista antropocêntrico engendra o sofrimento às grandes maiorias de excluídos. Para este sistema anticidadão inalteritário, o outro (alter) é totalmente destituído de vida, é coisificado, reduzido a um número, a uma estatística, a um elemento do consumo. Então, para este sistema perverso, o outro não tem configuração humana, uma vez que ele é objetivado para fins de lucratividade, produtividade, uso, etc.
O sofrimento das vítimas da violência estrutural do poderio econômico é indescritível pois possuem uma alteridade irredutível que desmascara a hipocrisia do neoliberalismo econômico.
A cidadania, a ética e alteridade se constituem no tripé do paradigma holístico, no modelo, no referencial para qualquer modo de convivência humana. Elas devem ser construídas na família, na escola e na sociedade, para nortearem todo o protagonismo juvenil na construção dos futuros projetos político-econômicos e todas as dinâmicas sociais e institucionais. Elas devem constituir a base de detecção e de ação para a erradicação do sofrimento das vítimas.
Um cidadão alteritário possui um compromisso inadiável para com as vitimas da violência estrutural, no que se diz respeito ao seu grito por dignidade humana.
A cidadania, a ética e a alteridade se constituem na base de sustentação do homem íntegro, cuja preocupação com o seu semelhante se constitui no autêntico imperativo ético, no dever ser absoluto, que emerge do clamor irredutível das vítimas indefesas da violência estrutural para serem reconhecidas na sua dignidade humana.
“Nunca deixo de pensar naqueles que sofrem, e junto com eles, caminho solidário”
(Oscar Niemayer)
Maurício da Silva é Professor e criador do Projeto Mundial Cultura da Paz e Não-Violência, do Movimento Vivavida Com Paz (MOVIPAZ) e autores de vários livros, entre os quais: Violência nas Escolas, Caos na Sociedade,Violência, o Desafio da Paz
Disponíveis na EVIRT.
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5 comentários:
"Alteridade: a palavra do século XXI" é o título do meu blog que trata de Direitos Humanos, Choque Cultural, Alteridade.
Dê uma olhada:
www.emchoque.blogspot.com
Parabéns pelo post!
Dê,
Gostei bastante desse post. Refleti em suas palavras, penso que esse seja o meu grande desafio, ideal, já que só podemos ser - qualquer coisa - a partir do outro (que não há de ser como nós somos)!
Suas palavras, despretensiosamente, dão impulso às minhas idéias, minha caminhada. Muito obrigada.
Com carinho,
"Flor" hehehehe =]
Dê,
Gostei bastante desse post. Refleti em suas palavras, penso que esse seja o meu grande desafio, ideal, já que só podemos ser - qualquer coisa - a partir do outro que não há de ser como nós.
Suas palavras, despretensiosamente, dão impulso às minhas idéias, minha caminhada. Muito obrigada.
Com carinho,
"Flor" hehehehe =]
É isso aí, Denise. Se não podemos aceitar os outros como eles são, como iremos aceitar as mudanças em nós mesmos? (já que não somos perfeitos, e viver é um constante aprendizado, onde revemos nossas atitudes). Como querer ser reconhecido pelo que se é, se não reconhecemos no outro as qualidades únicas dele?
Seja bem-vindo amigo, amante, aluno, estudante, pessoa, de Lisboa, Madri ou de João Pessoa.
Tudo de bom, nada de ruim, coisas simples, complexas, difíceis, atuais, modernas, antigas;
Não importa: sendo gente é o que importa.
Mas atenção!
Só tem uma condição: possuir muito amor: por gente, por bicho, por planta, pela dignidade humana.
E só.
Nesse texto acima de Denise o que acrescentar quando dessa maneira se expõe?
Poderia haver: machismo o preconceito a intolerância o abandono de nossos idosos e crianças a violência contra a mulher os atentados contra a natureza e suas crias e as injustiças sociais se Denise’s como essa fossem ouvidas?
Como duvidar da existência de Deus conhecendo e dividindo emoções que Denise promove pelo seu existir?
Em razão dessa mistura de várias fêmeas, flores, bicho, gente, educadora, aprendiz, homem, criança, afeto e mulher.
Que nasceu esse canto para que pudéssemos sugar as delicias que Denise nos é.
Cecél Garcia
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